domingo, 27 de junho de 2010

Os dias após a enchente


    Que esta pobre cidade nunca recebeu a atenção de tantos helicópteros, isso é certo. Por todos os lados ouvimos barulho de rotores. São azuis e vermelhos, como os da Defesa Social; brancos, como os das emissoras de TV; verdes com manchas escuras, como os das forças armadas. Ontem mesmo vi um monstro militar pousado num campinho onde meninos jogam pelada, entre vasto matagal, atrás do Batalhão. A nave parecia um helicóptero de brinquedo que ainda guardo.
    Nas ruas, o exército distribui comida e água para a população. Os soldados e a carga vão em caminhões pintados. Parabenizo o excelente trabalho que o Exército Brasileiro está fazendo em prol dos afetados direta e indiretamente pelo ensaio do Apocalipse.
    Li a pouco uma matéria noticiando que ajuda internacional chegará à Zona da Mata.

Relatos de pessoas ilhadas


    Um conhecido meu, na noite em que a água fazia das ruas palmarenses um único rio de correnteza feroz, só conseguiu se salvar porque subiu na cumeeira do primeiro andar da sua casa, onde permaneceu se equilibrando por cerca de 36 horas. Ele e a sogra. Relatou-me que, no final da madrugada, o dia começando a amanhecer após uma noite de escuridão absoluta por todos os lados, frio e chuva, viu, não muito distante, dois bois mugindo. Os animais nadavam sem direção entre as ruas, levados pela enchente, procurando terra firme. Não creio que morreram afogados, bois são excelentes nadadores.
    Outro conhecido enfrentou a cheia inteira em cima do palco armado no pátio da sulanca, onde seria festejado o São João. Não estava só – um grupo inteiro de pessoas ficou empoleirado na armação, que passou a noite se balançando como uma caravela encalhada. Quando todos pensavam que o palco ia virar, olhavam um para o outro, diziam “É agora!” e corriam para o outro lado, a fim de, com seus pesos, equilibrarem a estrutura.
    Soube ainda de pessoas que se salvaram abrigadas no topo de pés de coco. Outras que permaneceram em cima de baixas colinas que, literalmente, viraram ilhas.

Uma obra de Mozart

    Ontem estive ouvindo a Dominicus-Messe, KV 66, de Mozart. É tão bela que dá vontade da gente acreditar em Deus. Não é como essas missas celebradas pelo Brasil afora, que, assistindo-as, damos graças a Deus por sermos ateus.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

O cheiro do lixo

    Fui hoje, com Cícero, dar uma olhada na destruição das ruas do centro e tirar algumas fotos. Diferentemente do que o presidente da República falou na coletiva em nossa cidade, não vimos ninguém alegre ou sequer sorrindo enquanto arrumavam os destroços. Os rostos com os quais cruzamos eram de luto, cansaço, esforço para afastar a indisposição. As pessoas com quem o senhor presidente se deparou sorriam ou pareciam alegres porque estavam diante do famoso Lula. Só isso. Gente encarregada de algum tipo de chefia (especialmente um presidente duma nação) está cercada de falsidade, bajuladores, a verdade jamais é dita diante delas, sua vida pública é um teatro. Somente disfarçado de pessoa comum o Lula poderia ver os rostos reais dos palmarenses.
    A cidade inteira fede a depósito de lixo orgânico. A lama que cobre as vias virou um tipo de lavagem, pois o lixo mau cheiroso se fundiu a ela, formando uma mistura homogênea, uma sopa de nojo.
    Tratores, caçambas e gente trabalham sem parar na remoção dos escombros, mas ainda falta muito para a normalidade dar sinais de que um dia vai voltar.

Visitando um chefe de Estado

    Ontem, visitei o presidente Lula. Na verdade, ele é que veio visitar as ruínas de Palmares. Mas como fui até onde ele estava, posso dizer que fui visitá-lo.
    Não sou fã do Lula, ultimamente minha visão política está sendo até demasiado esquerdista, bem diferente do atual governo federal. Minha vontade era unicamente ver um chefe de Estado em pessoa, coisa que nunca me havia acontecido. Chefes de Estado, sejam como forem, são chefes de Estado.
    O presidente pousou bem em frente a Rádio Cultura, na colina conhecida por Planalto da Comunicação. Veio com alguns ministros e outros humanos, comitiva que ocupou dois helicópteros militares.
    As aeronaves não eram simples máquinas de voar: eram monstros! No momento em que o helicóptero do presidente estava pousando, tive de me agarrar a um corrimão para não ser levado pela força do vento. Lula usava uma camisa duma cor que na nossa língua se traduz por vermelho fogo gritante.
    Houve uma reunião na faculdade ao lado, com o presidente e a comitiva, depois todos os forasteiros saíram para dar um passeio pelo que sobrou das ruas; a piedade popular chegou a inventar que o mandatário de barbas chorou ao ver a desgraça da cidade; nada de anormal. O importante é que vi o presidente, eu que tenho São Tomé como o meu apóstolo favorito.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

As Crônicas de Nárnia (o terceiro filme da série)

    Já está sendo divulgado o trailer de As Crônicas de Nárnia – A viagem do peregrino da alvorada, que chega aos cinemas brasileiros dia 10 de dezembro. É uma das minhas séries de filmes prediletas. Adoro toda a magia da obra de C.S. Lewis e principalmente a adaptação que a Disney, em parceria com a Fox, fizeram para o cinema. Assistam ao trailer. Dá vontade de sair correndo para o cinema, independente dos meses que ainda faltam para o lançamento. Estou ansioso para ver esse filme em 3D!

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Entre escombros

    Ontem, calcei um par de botas, dessas usadas para caminhar nos esgotos, e fui dar um passeio pela Avenida José Américo de Miranda. As lojas que não desabaram ficaram sem as paredes dos fundos. Outras, estão com a estrutura frágil ou ameaçadas de desabamento. Da oficina de um conhecido meu só restou a parede da frente e, dentro, há uma Combi jogada no meio do entulho, como carro de brinquedo, e uma Besta com os pneus para cima noutro recanto.
    Agora a pouco passou por aqui uma frota de helicópteros das forças armadas voando para o norte. Só está faltando a presença de veículos da ONU para a paisagem se igualar a de lugares atingidos por bombardeios.
    O vídeo seguinte, feito pelo JC Online, mostra uma pequena fração da destruição que a cidade sofre.

Para quem ama

Acho que vou escrever um poema falando de amor.

Estou muito romântico hoje – né?!

Minha cidade desceu na cheia do rio Una, o que sobrou falta pouco para desabar e, o mais importante: as catástrofes me inspiram.


Liguei o rádio numa rádio fora do ar.

O chiado favorece minha inspiração, que rima com

Papelão, balcão, sabão, ladrão.

Som na caixa fora do ar!


Eu não estou bêbado, nem pirei, isto aqui é um poema – né?! –, que

Fala de

Amor.

Quando escrevemos poemas, devemos abandonar completamente a prosa, senão não teremos poema e se o autor disser no poema que o que ele escreveu foi um poema,

O autor pirou.


Sei lá! – né?! – Não gosto de repetição, só acho que vou escrever um poema falando de amor.

Mas sem repetição.

Como o amor.

O amor não tem repetição.

O chiado está me dizendo, não em prosa, em poesia, de tal forma que poesia faço,

O chiado está me dizendo que o amor é um chiado.

Cada ¡tzchzzchh! é irrepetível.


Tenho que me lembrar de que isto é um poema,

Não uma prosa.


O amor é um macaco andando de avião;

É um pedaço de plástico enrolado num sabão.

É um dinossauro fazendo cocô;

É as pétalas de uma flor.

É um azulejo português;

As barbas de um freguês.

É Deus, é Alá, é Javé;

É as pernas de Seu Mané.

É o Flamengo, é o flamingo, é o Corinthians;

É o Botafogo-go-go-go.


“Salve o Tricolor Paulista...”

Onde canta o sabiá?

Acho que vou escrever um poema falando de amor nas palmeiras do Polo Sul.

Mas as coisas devem fazer sentido – né?! – Nada no mundo pode carecer de sentido.

Nossas pernas devem estar pregadas em nossos pés e devemos andar.

E seguir amando.

Curtume de amor amado és.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

O Una mostra mais uma vez do que é capaz


    Muita coisa está acontecendo de uma só vez; é preciso ter dois ou três cérebros para dar conta de tudo! Primeiro, veio a Copa do Mundo, prendendo a atenção de todas as pessoas normais e anormais ao que está a acontecer na África do Sul; de repente, quando todos estão enfeitando as ruas com bandeirinhas juninas verdes e amarelas, numa mistura de São João com Mundial de futebol, vem uma enchente para levar a cidade a declarar estado de calamidade pública; e, terceiro, recebo a notícia da morte de José Saramago, fato que me deixou meio desnorteado.
    A situação parece aqueles filmes neoapocalípticos, onde de tudo acontece ao mesmo tempo. Parece que o fim do mundo se antecipou, de 2012 para agora.
    Hoje, nas ruas do centro de Palmares, cidade que já sofre com o desemprego, pobreza e falta de vida para a população, está se repetindo o que aconteceu na inesquecível cheia do ano 2000, se não me falha a memória ocorrida entre os dias primeiro e segundo de agosto. Enquanto escrevo isto, as águas do rio Una sobem sem parar. Comerciantes, desesperados, tentam proteger seus estabelecimentos, levando mercadorias e móveis para onde a água não alcance. Moradores das áreas de risco (está parecendo matéria de jornal!) carregam toda a mobília para andares mais elevados ou para locais longe da cheia. Caminhonetes, carros-de-mão, carroças-de-burro são usadas na tarefa, dependendo das condições financeiras do morador afetado. Uns, retiram seus pertences antes da água chegar; outros, retiram-nos já andando dentro da água, barrenta como a feroz correnteza do rio.
    Os arredores das ruas afetadas estão repletos de gente com sombrinhas e guarda-chuvas, são os curiosos, de todos os bairros, que vão assistir à fúria da natureza. Alguns motoristas tentam passar por dentro da água e, na área mais profunda, o carro “pifa”. Descem, empurram o veículo com ajuda de outras pessoas, põe-no em algum recanto, perto de outros carros “pifados”.
    Motos vão e vêm, bicicletas passam por todos os lugares; formam-se pequenos engarrafamentos, o caos é total. De vez em quando um helicóptero sobrevoa a cidade. Caro Saramago, agora posso falar contigo quando escrevo; todas essas cenas lembram-me o teu livro Jangada de Pedra!
    No texto abaixo eu disse que a previsão para amanhã era de 5% de probabilidade de chuva. Subiu, agora são 90%. Se a água continuar a subir, invadirá o Cine Teatro Apolo, inaugurado a exatos nove dias, e o destruirá mais uma vez. Eu estive lá e senti o cheiro da tinta nova nas paredes; agora, corre-se o risco de as mesmas terem cheiro de lama. A catedral, pelo menos, está em reforma – tremenda reforma –; não há o que se destruir nela.

Sobre as últimas chuvas

    São 07h35 de 18 de junho de 2010. Desde as 21h00 de ontem, chove sem parar. Tive notícias de que Catende teve graves deslizamentos de barreiras e inundações em partes da cidade. Alguns lugares da pobre Zona da Mata já têm vítimas fatais e, provavelmente, a cidade que mais sofre neste instante é Cortês.
    Palmares está em alerta, o nível do Uma sobe bastante e a previsão é de receber cada vez maior volume de água já que nas áreas a oeste do rio chove há horas e os afluentes estão com cheia. Além do mais, a lembrança do que aconteceu em 2000 ainda está fresca. Até em Santa Cruz do Capibaribe a chuva não deu trégua, levando o rio Capibaribe, que lá vive seco, a ter uma cheia. Chegou a cair raios ontem na capital da sulanca.
    No Recife todos sabemos a situação. Está naufragando, mergulhando em água e num caos total, levando todos nós a fazer a exclamação feita hoje por um jornal pernambucano: “Imagine a Copa aqui!”
    Abaixo, segue-se uma imagem de satélite gerada há pouco tempo, onde se vê a densa camada de nuvens que cobre parte do estado, provocando todas essas precipitações. Mas, segundo o INPE, a probabilidade de chuva para amanhã é de apenas 5%.



quinta-feira, 17 de junho de 2010

Não sei desenhar

    As pessoas pensam que eu sei desenhar, mas a verdade é que não sei de jeito nenhum. Minhas notas em artes eram as mais altas do colégio, os professores viviam me convidando para fazer cartazes, pintar quadros, cheguei a ser premiado pela qualidade de alguns desses trabalhos, mas, definitivamente, não sei desenhar.
    O fato é que apenas sei controlar bem a direção da mão, levando-a a traçar linhas, pontos ou manchas sobre uma superfície em geral plana, tendo como resultado final algo que agrada os olhos das pessoas. O setor do meu cérebro responsável pela criação é capaz de estabelecer sincronia perfeita com esta mão direita que vos escreve, guiando-a milimetricamente na representação de figuras vistas, lembradas ou criadas por mim. O conhecimento que tenho de geometria também ajuda muito a fazer com que todo mundo pense que sei desenhar.
    Só que não domino a técnica, nunca estudei desenho (por não haver onde), não tenho uma especialidade de traços, como a maioria dos desenhistas tem. Portanto, não me peçam para fazer desenhos para vocês, e não adianta dizer que me pagarão bem.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

A filosofia de PC Siqueira

    Sou grande admirador do pensamento desse importante filósofo que, como Sócrates, nada escreveu (até agora), transmite sua sabedoria unicamente pela linguagem oral. Acho que os antigos filósofos gregos fariam como PC Siqueira se, antes de Cristo, já existisse Webcams, Internet e YouTube. Que ideias estou tendo! Querendo que há dois mil e quatrocentos anos já tivessem sido inventadas coisas que, quando nasci, nem se sonhava que um dia fosse existir! Estou quase falando igual ao PC Siqueira!
    Sem mais delongas. Assistam ao vídeo abaixo e apreciem também essa riquíssima sabedoria.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Quando o frio do inverno chega

    É ótimo quando o frio do inverno chega, entre os meses de junho a agosto, e com ele as chuvas. Aqui, o frio vem úmido como o fundo dum rio e não é tão intenso. Enfim, podemos nos vestir de verdade e elegantemente e fazer as mais variadas combinações de casaco sobre camisa, golas espessas envolvendo o pescoço, camisa abaixo de outra camisa aberta, colete ou paletó de tweed, da forma que a criatividade ditar.
    Além disso, parece que o frio nos deixa mais criativos, fortalece nossa introspecção, nos deixa mais calmos e com certeza melhora nossa disposição para realizar trabalhos manuais.
    Eu, que sou meio astrônomo, preciso ver as estrelas. Todavia, não me importo com o fato de nessa época do ano o céu está nublado na maioria dos dias. É minha estação predileta. Seria o outono, se aqui o houvesse. Não havendo, que seja o inverno mesmo.

Por que outro blog

    Nada tem a vida tão curta quanto um texto publicado no Twitter. Tão curta é quanto a extensão do pensamento: 140 caracteres. Um tweet, ou “piu”, morre quando deixa de aparecer entre os primeiros da página “Profile”. Clicar no botão “More” é visitar o cemitério dos nossos tweets, isso quando o leitor se submete a tamanho trabalho.
    Pensando nisso, criei este blog. Aqui, escreverei o que, antes, eu escrevia em forma de sequência de tweets. Por que simplesmente não atualizar o blog Discovery, em vez de abrir outro?, pode alguém perguntar. É que, no Discovery, optei por publicar somente trabalhos mais densos em conteúdo e extensão. Não pretendo enchê-lo de blá, blá, blá; todo o meu blá, blá, blá ficará aqui, de modo que pode ser lido com maior facilidade e facilmente localizado em futuras pesquisas na opção “Arquivo”, localizada ao lado.
    O nome de ambos os blogs é uma homenagem aos ônibus espaciais da Nasa, fabulosos veículos pelos quais sou apaixonado desde antes de aprender a falar.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Compreender o simbolismo

Estou cada vez mais convencido de que o significado simbólico das coisas é algo completamente incompreendido pelas mentes analfabetas. O analfabeto pode ser, sim, apenas educado pelas acepções simbólicas que os letrados criaram para dominar as mentes simples, mas jamais podem "sentir" o peso do saber histórico, filosófico ou cultural emanado por algum significado simbólico.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Sobre o novo CD da Sandy

Não gostei do novo CD da Sandy. Não tem nada de original nele, assim como no clipe da música principal. Faltou criatividade inovadora.

Se eu fosse dar um recado à Sandy, diria que precisamos deixar a loucura se soltar em nós, que é da loucura donde brotam as grandes ideias. A normalidade a nada leva e nada produz.