sexta-feira, 18 de junho de 2010

O Una mostra mais uma vez do que é capaz


    Muita coisa está acontecendo de uma só vez; é preciso ter dois ou três cérebros para dar conta de tudo! Primeiro, veio a Copa do Mundo, prendendo a atenção de todas as pessoas normais e anormais ao que está a acontecer na África do Sul; de repente, quando todos estão enfeitando as ruas com bandeirinhas juninas verdes e amarelas, numa mistura de São João com Mundial de futebol, vem uma enchente para levar a cidade a declarar estado de calamidade pública; e, terceiro, recebo a notícia da morte de José Saramago, fato que me deixou meio desnorteado.
    A situação parece aqueles filmes neoapocalípticos, onde de tudo acontece ao mesmo tempo. Parece que o fim do mundo se antecipou, de 2012 para agora.
    Hoje, nas ruas do centro de Palmares, cidade que já sofre com o desemprego, pobreza e falta de vida para a população, está se repetindo o que aconteceu na inesquecível cheia do ano 2000, se não me falha a memória ocorrida entre os dias primeiro e segundo de agosto. Enquanto escrevo isto, as águas do rio Una sobem sem parar. Comerciantes, desesperados, tentam proteger seus estabelecimentos, levando mercadorias e móveis para onde a água não alcance. Moradores das áreas de risco (está parecendo matéria de jornal!) carregam toda a mobília para andares mais elevados ou para locais longe da cheia. Caminhonetes, carros-de-mão, carroças-de-burro são usadas na tarefa, dependendo das condições financeiras do morador afetado. Uns, retiram seus pertences antes da água chegar; outros, retiram-nos já andando dentro da água, barrenta como a feroz correnteza do rio.
    Os arredores das ruas afetadas estão repletos de gente com sombrinhas e guarda-chuvas, são os curiosos, de todos os bairros, que vão assistir à fúria da natureza. Alguns motoristas tentam passar por dentro da água e, na área mais profunda, o carro “pifa”. Descem, empurram o veículo com ajuda de outras pessoas, põe-no em algum recanto, perto de outros carros “pifados”.
    Motos vão e vêm, bicicletas passam por todos os lugares; formam-se pequenos engarrafamentos, o caos é total. De vez em quando um helicóptero sobrevoa a cidade. Caro Saramago, agora posso falar contigo quando escrevo; todas essas cenas lembram-me o teu livro Jangada de Pedra!
    No texto abaixo eu disse que a previsão para amanhã era de 5% de probabilidade de chuva. Subiu, agora são 90%. Se a água continuar a subir, invadirá o Cine Teatro Apolo, inaugurado a exatos nove dias, e o destruirá mais uma vez. Eu estive lá e senti o cheiro da tinta nova nas paredes; agora, corre-se o risco de as mesmas terem cheiro de lama. A catedral, pelo menos, está em reforma – tremenda reforma –; não há o que se destruir nela.

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